sexta-feira, 26 de novembro de 2010

História da Fotografia Brasileira

Entre os anos de 2002 e 2004, fui solicitada a escrever um texto sobre a história da fotografia no Brasil e produzi o material que segue na íntegra abaixo. Apesar de antigo, espero que seja útil:

O primeiro marco importante da fotografia no Brasil data do ano de 1833, quando, paralelamente ao desenvolvimento da fotografia na França por Niépce e Daguerre, um francês radicado aqui nas nossas terras, de nome Hércule Florence, desenvolve, também ele, um processo de registro com a ação da luz na Vila de São Carlos, atual cidade de Campinas.

A descoberta isolada no Brasil não teve inicialmente grandes repercussões, porém, após intensa pesquisa iniciada em 1977, Boris Kossoy, historiador, participa de um seminário em Rochester, EUA, requisitando seu reconhecimento público.

Da descoberta até a efetiva utilização prática da fotografia fica uma lacuna em que o Brasil não ofereceu grande colaboração no tocante ao desenvolvimento das facilidades técnicas, nem em termos de filmes nem de equipamentos. Mais expressivos foram países já desenvolvidos na época como os EUA, o Japão e alguns países da Europa.

A prática da fotografia entrou no nosso país através de estrangeiros, notadamente alemães e franceses, que vinham para cá montar estúdios para confecção de retratos. Primeiramente eles atendiam os nobres, depois os lambe-lambes foram se instalando nas praças, principalmente em São Paulo, no Jardim da Luz, fotografando famílias inteiras que buscavam obter retratos grupais ou individuais. Material esse hoje largamente aproveitado pelos estudos de antropologia.

Aos poucos a fotografia foi-se popularizando e os equipamentos mais simplificados começam a fazer despontar aqui e ali alguns abnegados, dentre eles Militão Augusto de Azevedo, que veio do Rio de Janeiro para se dedicar intensamente a retratar a cidade de São Paulo, seus escravos e seus nobres. Vale a pena visitar o Museu Paulista, sediado no Parque da Independência, onde está todo seu acervo que data do período de 1880-90 em exposição permanente.

Importantes no Brasil foram, posteriormente, as décadas de 40 e 50, marcadas não só pela crescente difusão da fotografia em nosso país, mas também pelo desenvolvimento de uma estética muito particular, a chamada "estética moderna", observável em trabalhos tanto na fotografia artística quanto na prática do fotojornalismo que já se iniciava no país.

Aliás é nesse período que a fotografia como forma de arte desponta, principalmente através dos inúmeros fotoclubes que surgem no Brasil, com destaque para a produção paulista desenvolvida por membros do "Foto Cine Clube Bandeirante". Geraldo de Barros, German Lorca, Thomas Farkas e Eduardo Salvatore são pioneiros na constituição dessa nova estética em que se observa o desenvolvimento de uma fotografia comprometida com o caráter nacional. Os fotógrafos criam uma expressão autônoma que acaba servindo de base para toda produção artística ao longo dessas décadas.

E é nesse mesmo período, mais precisamente em 1947, que o austríaco Hans Koranyi vem para o Brasil fundar uma editora para publicar uma revista brasileira especializada em tratar justamente destas questões estéticas: a revista Irisfoto. É bom lembrar que o período foi significativo para o florescimento da arte e da cultura no país, pois este mesmo ano marca a consolidação da FAAP e do MASP, o mais importante e reconhecido museu brasileiro no exterior.

No fotojornalismo a revista "O Cruzeiro" publicada a partir de 1944 valoriza mais o ensaio fotográfico do que o texto. A revista "Manchete" seguiu o mesmo padrão. Em 1952 a modernidade chega aos jornais brasileiros através da valorização dada à fotografia pelo jornal "Última Hora". Em 1966 a revista "Realidade" inicia a publicação de ensaios ousados das fotógrafas Claudia Andujar e Maureen Bisilliat. A revista "Veja" que começou a ser publicada em 1968, valoriza a informação porém sempre acompanhada da publicação massiva de fotografias.

O mais importante nessa questão é a inauguração do "fotojornalismo moderno" no Brasil, com imagens que assumem a construção da realidade e não a mera documentação do real. E o que estas publicações têm em comum é a adoção da estética fotográfica situada no contexto narrativo em que a imagem domina o texto. É um momento áureo do fotojornalismo brasileiro. O fotógrafo se arrisca para conseguir fotos surpreendentes e se transforma em herói. Pedro Vasquez, Evandro Teixeira, Luiz Humberto, Amílcar de Castro e Walter Firmo são nomes importantes a serem citados.

Nos anos 60 ocorre um declínio na fotografia fotoclubista e mesmo esse modelo de foto-reportagem, no final da década, começa a decair. Surge a televisão e a situação política do país não é das mais favoráveis. Todos aqueles conceitos estéticos de luz e de sombra, de ângulos inusitados, de grande expressão criativa, são incorporados pelo sistema, passando a ser utilizados como artifício e não mais como experiência.

Os limites entre arte e fotografia ficam estreitos e, em resposta, artistas da vanguarda como Hélio Oiticica, Hélio de Freitas, Antonio Manoel e Wesley Duke Lee, dentre outros, se apropriam da fotografia como parte de instalações, como registros de experiências efêmeras ou em performances.

Assim, as décadas de 60 e 70 são caracterizadas pelo "redescobrimento" da fotografia. O fotógrafo quer se expressar e expor em locais adequados. A oferta de publicações especializadas e o hábito para a aquisição da obra fotográfica como objeto de arte, estabelecem condições básicas para um surpreendente desenvolvimento da fotografia.

A partir daí começam a surgir as escolas de fotografia e uma tendência à profissionalização. Influenciados pelo filme "Blow Up" de Antonioni, exibido no final da década de 60, os fotógrafos aparecem como sinal de status.

No final da década de 70 os museus brasileiros começam a abrir suas portas para a fotografia, trazendo inicialmente nomes expressivos da fotografia internacional. Dentre algumas das importantes exposições realizadas na época o destaque é para Henri Cartier-Bresson, em 1970. Outra exposição importante foi a "Nove Fotógrafos" em 1971 e, depois, em 1974 as de Brassaï, Ansel Adams e Bill Brandt. O interesse tanto dos empresários quanto do público é crescente.

Muitos espaços foram se abrindo para exposições fotográficas. Primeiro veio o MIS, depois a Pinacoteca do Estado, em seguida o MAM, responsável pela I Trienal de Fotografia, que contou com a participação de 71 profissionais em 1980.

Nesse período o interesse do fotógrafo pelo registro do homem brasileiro, de suas raízes culturais, seu ambiente, suas condições de vida e de trabalho, sua problemática social e política nas zonas rurais e urbanas, cresce. O fotojornalismo independente passa a ser a grande tendência.

O fotógrafo Pedro Martinelli é um exemplo desse tipo de trabalho individual. Ele acumulou anos de conhecimento como editor, fotógrafo de estúdio e repórter-fotográfico trabalhando para terceiros e, de repente, se vê apto a gerenciar seu próprio trabalho. Ele peregrina num barco pela região amazônica e desenvolve um projeto que ganha as páginas das principais edições do país. Sebastião Salgado é outro fotojornalista independente que vem provando que o melhor do fotojornalismo está na profundidade dos temas e na maneira pessoal de documentar histórias.

Atualmente o que se discute no país é a questão da invasão da tecnologia digital. No fotojornalismo, o Brasil já atua hoje com a transmissão de fotos para todo o mundo através do telefone, celular ou não. Durante uma viagem, de dentro do próprio carro, o fotógrafo transmite seu trabalho para um grande número de jornais, chegando para publicação imediata. Em estúdio não é diferente. Fotos que não necessitem grandes ampliações, como as fotos para folhetos ou catálogos, já são processadas digitalmente. Nas câmeras de grande formato, o back Polaroid vem paulatinamente sendo substituído pelo back digital. As manipulações de imagem feitas através de programas como o Photoshop são cada vez mais utilizadas, tanto para corrigir imperfeições como na área criativa.

Entretanto o que se nota é que mesmo que ela venha a superar todos os processos usados até agora, a fotografia tradicional tem onde se alojar. O caráter pessoal do trabalho e o processamento P&B da fine-art sempre vão conviver ao lado de outros processos.

Autoria: Beth Barone

Bibliografia Utilizada:
"A Fotografia Moderna no Brasil" de Helouise Costa e Renato Rodrigues, 1995, Editora UFRJ.
"Em Torno da Fotografia no Brasil" de Pietro Maria Bardi, 1987, Banco Sudameris Brasil.
"Edição Especial da Revista Irisfoto 50 Anos", No. 500, 1997, Editora Iris.
“Imagens da Fotografia Brasileira” de Simonetta Persichetti, Vols.1 e 2, 2000, Editora SENAC.